‘Ela’: hiperconexão (virtual) X desconexão (sentimental)

Ela

“Ela” (Her), filme de Spike Jonze que concorreu ao Oscar 2014, é triste.

E não porque fala de solidão, mas por mostrar uma solidão que já praticamos, um futuro imaginado que já está entre nós, geração hiperconectada que rende-se à preguiça de preferir contatos virtuais a pessoais (é mais fácil!).

Em uma das primeiras cenas, a personagem de Joaquin Phoenix está na rua falando sozinho, ou melhor, com seu sistema operacional, que tem inteligência artificial, voz e nome de mulher – Samantha. Nem todos os espectadores percebem que nesta mesma cena todos em torno dele também “falam sozinhos”, ou seja, com seus dispositivos eletrônicos.

A cena se repete em outros momentos do filme, mas então já percebemos como todos naquele futuro “imaginado” estão alienados, indiferentes aos outros seres humanos em torno, concentrados nas máquinas que lhes ouvem e respondem em qualquer situação.

Theodore (Phoenix) está se divorciando. Interagir com “alguém” criado para responder a todas as suas questões, práticas e sentimentais, parece a solução ideal para tirá-lo do luto pelo final da relação com sua companheira desde a infância.

A ironia é que nenhum amigo acha estranho quando ele admite que está em um relacionamento com um sistema operacional. Uma de suas melhores amigas, também recém-divorciada, confessa que, como ele, passou a se relacionar com o próprio sistema operacional. Daí que levar o computador como companhia a um piquenique de casais torna-se natural. O fato de Samantha tratar-se de uma “pessoa sem corpo” é irrelevante.

Mas onde há inteligência, mesmo que artificial, nada fica igual para sempre. Samantha começa a ir além de seu mundo com Theodore, a buscar satisfação para suas curiosidades e novos questionamentos – eles brotam onde há consciência – na interação com outros sistemas e usuários.

Theodore terá que lidar com uma questão nova para aquela relação, mas tão antiga quanto a história de todas as relações e para a qual a geração hiperconectada às máquinas – e cada vez mais desconectada dos sentimentos – ainda não encontrou: como não ficar só em um mundo no qual todos estão sempre procurando respostas para seus vazios fora de si mesmos?

O filme não tem resposta para isso.

Como disse, triste, triste, triste…

1 comentário

  1. Gostei muito do seu texto. E do filme também. Também escrevi sobre ele no meu blog, com uma abordagem um pouquinho diferente. Se quiser conferir…
    http://rodrigozivi2.blogspot.com.br/2014/02/pe-na-bunda.html

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