‘F’ de festa

Amo festa. Música, dança, bebida para quem quiser, gente mexendo o corpo, sedução, descanso para as preocupações. Tanta gente fala isso agora: quando sairmos da pandemia, a primeira coisa que vou fazer vai ser uma festa. Eu também tenho dito isso. Comemorar meu aniversário. Comemorar todos os aniversários passados em isolamento. Comemorar a vida, os amigos. Comemorar nada. Só viver em liberdade e suspensão por algumas horas. Dançar até suar tanto que parece mais que saí de uma aula de spinning (eu ia escrever aeróbica, o que mostra minha idade – não quero mentir). Trocar um olhar. Fechar os olhos e soltar a imaginação. Fazer várias festas para as várias turmas. Fazer uma festa para misturar as turmas. Dançar sozinha ou agarrada a alguém. Se entregar ao que foi taxado de ridículo pelos recalcados. Meus filhos, que me chamam de ridícula quando danço sozinha em casa, me perguntaram do que mais sinto falta na pandemia. Do bar e das festas com os amigos, foi a resposta.  Amo uma mesa de bar também. Agora só quero sair para festas e bares. O resto vou fazer de casa mesmo.

Nesse sol de inverno tenho pensado mais em Paraty. Na festa literária brasileira mais famosa, mesmo com todas as críticas. Mas até Cristina, em Minas Gerais, foi uma festa. Porque veja bem: não falo de feira. Eu falo de festa. Na festa do meu sonho, nessa semana, tinha sol de inverno e ruas de pedras. E ladeiras. Talvez Salvador. Talvez Ouro Preto. Talvez não precise localizar a cidade no sonho. Pensar menos e sentir mais. Tinha gente, tanta gente nas ruas, nos restaurantes, nas lanchonetes, nos bares. Tinha um escritor que eu queria beijar com um bebê no colo. E teve um beijo bom demais trocado em uma festa. Um moço tão lindo, com a boca descrita pela Jacqueline Woodson no livro “Um outro Brooklyn”. Um moço que tocava uma guitarra triangular, preta e brilhante, como a pele dele. Antes de ele subir no palco, antes de nos beijarmos, eu tirei a poeira da guitarra, com um pano macio ao toque. Toda a gente, como escrevem os portugueses, dançava e dançava muito. Toda a gente ria.

Queria passar um ano em festas literárias. Fazer um calendário para acompanhar todas. Andar pelas ruas cheias de pessoas com o amor pela literatura em comum. Pessoas com livros nas mãos, debaixo do braço, nas filas de autógrafos, trocando dicas de leitura, falando mal disso e bem daquilo. Ou vice-versa. E pessoas nas mesas de bares. E à noite nos espaços transformados em pistas de dança. Dançar até não sabermos quem somos. Queria um Woodstock literário, uma festa à la Tim Maia, vale tudo, e vale até mais, porque vale homem com homem e mulher com mulher, vale o que a gente quiser. Por uma noite que seja. A literatura tem me sustentado, mas eu preciso de festa.