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Diário de Viagem: Granada – II

“Sete dias em apenas uma cidade?”, questionam muitos conhecidos sobre minha primeira viagem internacional. A série “Diário de Viagem: Granada”, a que dou continuidade com esta postagem, vai explicar porque sete dias ainda não foram suficientes para eu conhecer toda a beleza e história da capital da Andaluzia, na Espanha. Estava devendo esses relatos a muitos amigos e leitores. Espero que apreciem.

 

Cheguei a Granada em uma manhã da Primavera europeia.

Minha primeira visão da capital Andaluza, emoldurada pela janela do ônibus que tomei em Madri – deve-se desembarcar no aeroporto Madrid-Barajas, o mais próximo -, foi dos picos brancos de Sierra Nevada, o maciço montanhoso considerado Reserva da Biosfera pela Unesco.  Um dos cartões postais da província, a serra tem seus picos nevados o ano todo, razão pela qual abriga um pueblo (povoado) com estação de esqui.

Por ter reservado três dias para conhecer um pouco da capital espanhola, já cheguei com o olhar encantado pelas belezas arquitetônicas, museus e parques madrilenhos. Mas nada me preparou para a imersão que vivenciaria na secular Granada, fundada pelos mouros na Idade Média e tomada por reis católicos em 1492, mas cujos primeiros vestígios arqueológicos datam do século VII a.C..

Entendi logo porque meus anfitriões – brasileiros que escolheram Granada para curtir sua aposentadoria – decidiram não ter carro na cidade de 234 mil habitantes e 88 km² de área.

O metrô de superfície é limpo, eficiente e fácil de usar. Estacionadas por vários locais públicos, vê-se bicicletas amarelas de um serviço de aluguel por aplicativo, que podem ser usadas e deixadas em qualquer outro ponto para o próximo usuário. Ciclovias acompanham as largas calçadas das principais artérias da cidade.

Não há engarrafamento no trânsito e o tráfego, até nas vias mais movimentadas, flui contínuo e silencioso.

A paisagem urbana conjuga arquitetura milenar e contemporânea mesmo na parte moderna da cidade. Mas o que me tirou o fôlego mesmo foi a primeira visita ao Centro Histórico, que guarda vestígios da ocupação moura em edificações preservadas por séculos.

 

Centro histórico

Margem do rio Genil

Granada foi edificada na ampla depressão formada pelo rio Genil, para o qual confluem os rios Darro e Beiro.

Nosso caminho a pé até o Centro Histórico se deu a partir do Genil, margeado por calçadas no nível mais alto e, em alguns trechos, por passarelas de pedestres no nível da água, às quais se tem acesso por escadas.

Naquela primavera, a passarela estava emoldurada por flores de todos os matizes na maior parte do caminho.

Para chegar ao Centro, viramos na Acera Del Darro, passando pela Fonte de Las Granadas e seguimos pela Carrera de Las Virgens, que passa pela fachada da linda Igreja da Virgen de Las Angustias.

Chegamos por ela à Calle de los Reyes, que percorremos por um pequeno trecho, passando pela Plaza Del Carmen, onde fica a Prefeitura, para entrarmos por um beco que levou à Plaza Bib-Rambla, que concentra lojinhas e quiosques de vendas de suvenires.

Plaza Bib-Rambla

Dali meus anfitriões me conduziram por outro beco, onde tive meu primeiro grande choque de encantamento na cidade. Em um instante, estava apreciando lenços em uma vitrine. No outro, ao me virar, quedava boquiaberta ante a fachada grandiosa da Catedral de La Encarnacion, construída no século 14, após a tomada da cidade pelos reis Felipe de Castela e Isabela la Catolica.

Fachada da Catedral de la Encarnacion

Com projeto assinado pelo arquiteto Diego de Siloé e contribuições dos arquitetos e artistas Enrique Egas e Alonso Cano, o templo católico representa o Renascimento Espanhol. Particularmente, o entendi como uma resposta católica à opulência da cultura moura, cujos vestígios ainda podem ser encontrados até hoje por toda Granada, ainda habitada também por muçulmanos – pelas ruas, em meio a turistas, vê-se mulheres de véu na cabeça trajando trajes caríssimos e joias idem.

Interior da Catedral de la Encarnacion

A catedral valeu um tour guiado por seu interior suntuosíssimo (5 euros a entrada), que permite a apreciação de vários altares com esculturas e pinturas da mais rica arte sacra do período.

O tour termina em uma lojinha de suvenires com saída na direção da Gran Via de Colón, a avenida principal do Centro. Por ela voltamos à praça Isabela La Catolica e seguimos pela Calle de los Reyes até a Plaza Nueva, que abriga o edifício (também de arquitetura secular) Palacio de La Justicia, entre outras edificações antigas ocupadas por pequenos comércios.

Palacio de la Justicia

 

“A rua mais linda do mundo”

Hora de entrar na que meu anfitrião, Eduardo, considera “a rua mais linda do mundo”: Carrera Del Darro, que, obviamente, margeia o rio Darro.

Carrera del Darro, “a rua mais linda do mundo”, segundo Eduardo.

Igreja de São Paulo e São Pedro Apóstolos

Caminhamos a pé por seu leito carroçável de pedras, ladeado, no caminho, por mais edificações do período medieval. Entre elas, a Igreja de São Pedro e São Paulo Apóstolo.

Por ela chegamos ao Paseo de los Tristes – assim chamado por ter sido, no passado, o caminho para o cemitério – de onde se vislumbra, de um lado, no alto de uma montanha, a fortaleza de Alhambra (sobre a qual escreverei numa próxima postagem). De outro, as ruelas medievais do bairro Albaicín, de origem cigana, que também conduzem montanha acima.

Andar pelas ruelas estreitas e sinuosas do bairro dá a deliciosa sensação de imersão em tempos antigos, com seu casario modesto conservado, a despeito das lojinhas de artigos atuais que encontramos pelo caminho.

No ponto mais alto do bairro está o Mirador de San Nicolás, de onde turistas podem tirar fotos panorâmicas maravilhosas da cidade e, particularmente, da fortaleza de Alhambra, que nos observa agora do mesmo nível, do outro lado do vale do Darro.

Vista do Mirante de San Nicolás

Ao longe, a silhueta da Sierra Nevada, que nos espreita de qualquer canto da cidade.

Descobri que mirantes, talvez por nos colocarem mais próximos do céu, são bons lugares para nos sentirmos gratos pela vida!

 

Galeria
(fique em qualquer imagem para ampliá-la)

Maior que o mundo

Du, Clara e eu em Granada: felicidade pura

Meu mundo cresceu!

Depois de ter encolhido ao tamanho de cinco centímetros de um salto fino de mulher, como explicado em crônica anterior, ele se ampliou para além de um oceano.

Foi graças a Du e Clara, aqueles mesmos, que desmontaram a vida no Brasil para viver na Espanha, lembram? Mais que inspiração para enfrentar os medos que me encolhiam, eles foram suporte carinhoso na realização de um sonho que eu sequer imaginava ao meu alcance: conhecer o Velho Mundo.

Até o início de minhas férias, em abril deste ano, eu e a amiga Marcinha – outra querida, citada por ter me feito o convite para o Chile – tínhamos feito planos para uma viagem por cidades de Minas Gerais. Mas sua tia adoeceu e ela reconsiderou.

Após uma consulta “hipotética” ao Du, pelo WhatsApp, fui convencida (ele é muito bom nisso) a me lançar na aventura além-mar. Daí que, entre decidir que ia, comprar passagens – em um processo dificílimo que consumiu um dia inteiro do querido Du na internet – e preparar bagagem, foram menos de TRÊS (!!!) dias.

Puerta del Sol, em Madri

Embarquei na madrugada de um domingo rumo a São Paulo e, depois, Madri, onde Du e Clara já me aguardavam com outro de seus impagáveis carinhos: um apartamento alugado via Air Bnb para nos hospedar por três dias na capital espanhola.

Lá eles me guiaram por um tour maravilhoso, que incluiu belezas arquitetônicas e delícias gastronômicas. No restante dos dez dias de minha viagem, só fizeram ser meus guias por Granada, a linda e adorável cidade da Andaluzia – Sul da Espanha – que escolheram para viver.

E eu, que mal andava meio quarteirão, encarei 10 km por dia de passeios – gastei tempo e alguns euros em curativos e escalda-pés para acalmar inchaços e bolhas, mas valeu a pena!

Descobri que os andaluzos são os brasileiros da Espanha; que Paella valenciana se come junto, em torno de um mesmo tacho; que vinhos maravilhosos podem ser comprados por 4 euros em um mercado de esquina e que a Andaluzia tem azeites tão deliciosos que eu tomaria de caneca se não temesse as calorias.

Márcio, meu marido, que não pôde me acompanhar na viagem, ainda encomendou-me o contato com um parente espanhol que só conhecia por Facebook. Pepe Pelegrina, que nem me conhecia até então, provou sua hospitalidade andaluz levando-me para conhecer a neve na estação de esqui de Sierra Nevada.

Eu com Clara, Du e Pepe em Granada

Detalhes sobre os maravilhosos passeios deixo para a matéria de turismo que estou preparando. Este texto é para falar sobre como a amizade, esse “amor” sem posse tão gostoso de sentir, tem o poder de ampliar mundos e transbordar o coração de felicidade.

E eu que não sabia que as minhas transcendem oceanos… e me fazem sentir maior que o mundo.

 

 

Diário de Viagem: Granada

Sierra Nevada: a primeira visão

Dormia no ônibus que nos trouxe de Madri quando a desaceleração me despertou. Entrávamos em Granada, a milenar cidade espanhola (desde o século 13, pois sua origem é árabe) que hoje é o lar de Clara e Eduardo – desses amigos que a gente sabe que terá (e amará) para a vida toda.

A primeira visão que tive da janela foi de um ajardinado colado a um pequeno viaduto, donde se destacou, para meus olhos, uma arvorezinha de flores liláses. Brotou-me um sorriso involuntário (“bom presságio!”).

Logo que o ônibus livrou-se do pequeno congestionamento à entrada, Clara chamou minha atenção para a visão dos picos sempre brancos da Sierra Nevada, que – eu descobriria – pode-se buscar de qualquer ponto da cidade.

Depois o metrô de superfície, que os usuários pagam eletronicamente ao entrar – nenhuma roleta ou fiscal obrigando a cobrança, apenas a consciência dos usuários -… a primeira caminhada por ruas que conjugam arquitetura milenar e contemporânea… o espaço urbano amplo, limpo, calmo… o trânsito “silencioso” apesar de intenso.

Por uma e outra calçada, bicicletas amarelas que se pode pegar, usar e deixar em qualquer outro ponto para serem usadas por outras pessoas – nunca são furtadas ou vandalizadas.

Não vi carros velhos pelas ruas. “Não vale a pena manter os com mais de cinco anos, com todas as revisões exigidas por lei e impostos”, explica Clara.

Com Du e Clara em ruela do bairro Albaicín, de origem árabe

Mas o casal não tem carro aqui. Tampouco usa muito o barato, eficaz e confortável sistema de transportes da cidade. Desde que se mudaram em definitivo, em novembro de 2017, Clara e Du fazem todos os percursos por Granada a pé – inclusive os passeios pelos bairros íngremes, que expandem-se colinas acima dos rios Genil e Darro e que mantêm os traçados de ruelas estreitas do período medieval, proibindo o trânsito de automóveis.

Eu os tenho seguido alegremente desde a última quarta, a despeito das canelas ressentidas pelo prolongado sedentarismo e das bolhas causadas por um tênis novo (erro primário!).

Percebo que observam com amoroso prazer meus sustos emocionados, minhas descobertas do quão lindo pode ser o mundo.

Hoje o domingo amanheceu frio, finalmente – a primavera na Espanha é feita de dias ensolarados e temperaturas amenas, em torno dos 24 graus -, convidando-me a esta escrita, que “costuro” no sofá da sala, devidamente aconchegada sob uma mantinha felpuda.

Evoco as saudades de meus entes queridos, que a estas horas de nossa manhã aqui devem estar mergulhados no sono da madrugada de lá. Envio-lhes uma prece amorosa e peço que me aguardem “un poquito más”.

Quando voltar, cheia de saudades e histórias, lhes contarei tudo sobre o quão lindo (e civilizado) ainda pode ser o mundo.

Granada (Espanha), 29 de abril de 2018.

 

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